Choques culturais e curiosidades na Suíça

Este post parte de experiências minhas enquanto vivi em Berna entre 2015 e 2017, e desta pergunta no Quora, sobre os possíveis choques culturais que você pode vivenciar ao ir à Suíça pela primeira vez, ou ir viver lá, além de curiosidades que chamam a atenção de quem não está acostumado. Não se trata de críticas, nem de preferências. Sobretudo para quem tem em mente emigrar, ou você se adapta ou vai embora. Imigrante ingrato não se integra em nenhum lugar do mundo. Então, vamos aos choques que vivenciei, os quais também chamam a atenção de muitos estrangeiros vivendo na Suíça.

Pontualidade e planejamento excessivos

Suíços são famosos pela pontualidade e essa fama se confirma em todos os detalhes do cotidiano. São pontuais como os alemães? Suíços são mais pontuais que alemães, e como me disse o fundador da CultureMee num post de Facebook, os suíços da parte alemã são mais pontuais que os da parte italiana e os da parte francesa. Se o trem atrasa 2 minutos, a companhia ferroviária pede desculpas em jornais, rádio, TV, mídias sociais, etc. Se atrasa mais de 2 minutos, os suíços tendem a ficar em pânico e para maiores atrasos, passageiros costumam pedir reembolso. Atraso é inaceitável na Suíça, é tido como ofensa.

Seguindo à pontualidade em milissegundos, é um costume bem suíço de planejar tudo com antecedência, inclusive na vida pessoal e social. Vamos tomar uma cerveja? Um café? Sim, claro, eu tenho um tempo livre às 20:00h da primeira quarta-feira do mês X, ou às 21:00h da terceira sexta-feira do mês Y. Espontaneidade à suíça é marcar com uma semana de antecedência, nunca me acostumei com isso.

Dia-a-dia previsível

A noção de tempo dos suíços é milimetricamente linear e você sente aquela sensação de previsibilidade, aquele controle de poder planejar até o que vai fazer às 15:00h do primeiro domingo de novembro de 2030. Se você já viveu em outras partes do mundo, sobretudo em países com uma noção de tempo fluida e com um cotidiano imprevisível, como foi minha experiência na Índia, a Suíça é o extremo oposto e pode ser muito entediante a depender de como você leva a sua vida. Esquece espontaneidade.

Regras para tudo

Junto com o costume de planejar tudo, suíços são também conhecidos por serem muito regrados. Um mínimo de regras para viver em sociedade, tudo bem, mas em excesso dá uma sensação de “puta merda”. Notei que o pessoal na parte alemã é mais regrado que na parte francesa. Por exemplo, em Genebra via o pessoal atravessando a faixa de segurança sem ser sinal verde a alguns metros de viaturas. Na parte alemã, para pensar em atravessar a faixa de segurança quando o sinal não está vermelho, o pessoal olha se não há nenhum policial por perto, pois se é pego, leva multa.

Dificuldade de se socializar com suíços

A dificuldade de se socializar com suíços foi o meu maior choque cultural no país. Se você não cresce na Suíça durante a infância e adolescência, dificilmente vai ter um amigo suíço. A maioria dos suíços cresce em vilarejos de 2.000 ou 4.000 habitantes, com a sua meia-dúzia de amigos desde a infância. E cheguei a conhecer duas pessoas suíças que cresceram no estrangeiro devido à carreira de seus pais e retornaram ao país sem amigos suíços, como um estrangeiro que se muda para o país. Minha vida social era, basicamente, com estrangeiros que viviam lá há anos e sua vida social era majoritariamente com outros imigrantes, inclusive aos que lá cresceram, através do Internations. Estávamos todos no mesmo barco. Alguns com quem convivia já retornaram ao país de origem ou se mudaram a outro país, chega uma hora que cansa. A vida social com que estamos acostumados na América Latina, em Israel e no Mediterrâneo, aquela coisa de todo mundo se fala e se conhece, não existe na Suíça.

A dificuldade de se socializar com locais é um dos maiores desafios para estrangeiros na suíça.

Mulheres não-femininas

Junto à dificuldade de se socializar com suíços, outro dos meus choques no país foi a maioria esmagadora de mulheres que não são femininas, com direito a pelo no sovaco e bigode, ou a xingar o marido (parceiro, desculpa) que oferece uma ajuda para carregar uma sacola – sobretudo na parte alemã. Não é exclusividade da Suíça, é algo que tenho visto por todo o centro e norte da Europa, o que também explica uma grande quantidade de homens destas regiões indo procurar mulheres na América Latina, no Leste Europeu, nas Filipinas, Tailândia, e contatando agências de casamento na Rússia e na Ucrânia; onde quer que mulheres sejam femininas. Faria o mesmo no lugar deles. Mesmo homens que crescem acostumados a mulheres se vestindo como skatistas e ao politicamente correto ficam fascinados quando veem mulheres bem-arrumadas, maquiadas, de banho tomado, de salto, etc. É a mais pura verdade.

Notava nos meus colegas suíços – tal qual alemães, escandinavos, holandeses, etc. – que procuravam uma namorada a dificuldade de se aproximar de uma mulher. Eles já são extremamente tímidos e inibidos a ponto de ter que beber muito e até apelar para drogas, e a cada nova onda politicamente correta, a insegurança de ser mal visto e rejeitado só aumenta. Será que ela vai pensar que pareço machista? Que não sou vegano? Que não sou cool? A competição entre homens e mulheres leva a uma distância equivalente ao de países onde o contato entre ambos os sexos é um tabu. Logo, a coisa está num ponto onde a paquera já começa através de sites de encontro e apps como o tal do Tinder, tamanha a dificuldade de abordar uma mulher cara a cara. E se não rolar nada virtualmente, a solução é ir arrumar uma estrangeira.

Por que o número de homens suíços se casando com estrangeiros não pára de crescer? Photo by Denis Oliveira on Unsplash.

Troca de roupas ao vivo

Enquanto um biquíni brasileiro pode chamar a atenção nos lagos e piscinas, mas sem assédio até onde eu tenha visto, é normal nas piscinas públicas, nos rios e lagos da Suíça ver pessoas trocando de roupa ao vivo e a cores. Você está deitado na grama e, de repente, o elemento tira a sunga ou o calção, fica peladão e põe a outra roupa. Tem diferenças de costumes que é melhor nem tentar entender.

Venda ao ar livre e caixa com dinheiro

Não é uma exclusividade da Suíça, mas de qualquer maneira, é normal ver produtos vendidos ao ar livre ou dentro de edifícios com uma caixa onde está o dinheiro, seja queijo, chocolate e outros produtos locais. Você escolhe os produtos que deseja comprar, pega e recolhe o troco direto da caixa. Se faz isso no Brasil, roubam o dinheiro, os produtos e até a mesa.

Falar de dinheiro é um tabu

Falando em dinheiro, a Suíça atrai imigrantes de todo o mundo pela sua prosperidade econômica, mas falar de grana é um tabu para muitos suíços. Mais tabu ainda é perguntar sobre o dinheiro sujo guardado na Suíça, algo que sempre vi encarado com desconversas em toda ocasião que perguntei (e continuo curioso). O fato é que políticos corruptos de todos os cantos do mundo, máfia russa, máfia italiana, só para mencionar alguns exemplos, lavam dinheiro nos bancos suíços e se aproveitam das leis de sigilo bancário. A Suíça era um país pobre antes da II Guerra Mundial e ainda é visível nas gerações mais velhas o medo de perder a grana.