Curiosidades da Índia

Curiosidades da Índia: Choques Culturais

Vivi em Jaipur durante 2012 e, neste post, vou compartilhar alguns dos choques culturais que vivenciei na Índia, dos quais eu me lembro, já que foram muitos. A Índia é uma bolha à parte do resto do mundo em se tratando de entender como este país “funciona”, tal qual como pensam e vivem os indianos. Lógica não tem utilidade prática uma vez que se pisa no território indiano, e o melhor a fazer é procurar se adaptar como pode em vez de tentar entender as inúmeras curiosidades do cotidiano. Então, aqui vai uma lista dos meus choques culturais no país, na Índia como ela realmente é e como você vai encontrar.

Indianos balançando a cabeça

Indianos balançando a cabeça é tanto confuso quanto engraçado para um estrangeiro recém-chegado à Índia. No cotidiano, você nunca sabe se a balançada de cabeça significa um sim ou não. Você pergunta algo e a pessoa balança a cabeça. Pergunta novamente se a pessoa tem certeza, e balança a cabeça. Pergunta de novo, para eliminar quaisquer dúvidas, e mais inseguro você se sente com mais uma balançada de cabeça. Assim é a Índia, não é?

A falta de vida noturna

Cheguei à Índia num fim de tarde de sábado depois de uns 2 dias de viagem e meu relógio biológico nem sabia mais se era dia ou se era noite. Só sei que estava no pique de sair à noite, naquela época ainda era baladeiro em atividade, hoje aposentado da noite… Chego à boate com um grupo de intercambistas, e eis que vejo uns 2.000 homens pelo menos e … só 13 mulheres, contei uma por uma, das quais 7 eram estrangeiras. Em função de uma briga (muito pinto e pouca franga), a polícia mandou fechar, isso era umas 23:30h no máximo. E assim foi minha primeira noite na Índia, bares e boates fechando antes da meia-noite, se chegasse até às 2 ou 3 da manhã, era muito. Mumbai foi a exceção, onde vi vida balada de verdade, e mesmo lá, a vida noturna não faz parte da cultura indiana e o povão não vê isso com bons olhos.

Os mano pira com as mulheres

Um dos primeiros choques culturais que tive na Índia foi o jeito com o que a maioria dos homens indianos olham para as mulheres, daquele jeito “comendo com os olhos” como se nunca tivessem visto uma mulher na vida. E nem se fala em se tratando de estrangeiras com pele clara, aí os mano pira de vez, como descrito neste post no blog Brasil com Z e neste sobre cuidados para mulheres viajando no país. Na minha primeira semana, estava eu num restaurante em Jaipur com uma brasileira e uma marroquina, e um indiano a alguns metros de distância me xingava: “Como assim? Você tem duas gurias e eu, nenhuma?”. É isso mesmo, e ainda tem quem as indianetes com o papo de namorado indiano que conheceram na internet, vão procurar o que fazer, parem de assistir a novelas.

Distância entre homens e mulheres

Além do assédio sexual, era visível no dia-a-dia uma distância existente entre homens e mulheres, fosse no trabalho e em qualquer outra situação, sempre há uma certa formalidade. Veem-se pelo país escolas para meninas e para meninos, e até nas universidades tal separação se mantém nos campi e nos dormitórios. É importante observar esta distância, senão, um indiano pode entender que você, mulher estrangeira, está lhe dando mole só por estar conversando com ele. Ou uma indiana pode entender que estou dando em cima dela se a convido para um café.

Dieta vegetariana

Não me adaptei à dieta vegetariana e subestimei como adaptar ao viver na Índia por um longo período, logo eu acostumado a churrasco. Emagreci uns 10 kg. Até achava carne, mas os padrões de higiene locais de jeito nenhum me passavam confiança. Dá para saber quando um vegetal está estragado, contudo, uma carne estragada cozida ou assada pode ser comida sem perceber até você ter uma intoxicação alimentar. Não tive nenhuma intoxicação na Índia porque não corri o risco ao ver alguns colegas indo parar no hospital por intoxicação. Como descrevo no post “Índia para não-vegetarianos”, a dica é procurar os restaurantes punjabi, afegãos e tibetanos; e ir aos estabelecimentos mais movimentados por terem giro de estoque.

Barganhar toda hora

Fora dos supermercados, dos shopping centers e do varejo formal, os preços na maioria dos estabelecimentos indianos não são tarifados. Logo, você tem que barganhar, seja na hora de pegar um autorickshaw, de contratar uma excursão, e tudo o mais pelo que esteja pagando. A regra é, antes de tudo, ter uma ideia dos preços e negociar, já que é implícito na cabeça dos indianos que estrangeiros devem ser sobretaxados. Se não estiver atento, eles sempre dão um jeito de levar vantagem. Sempre que comprar um produto nos supermercados e nas vendas locais, verifique na embalagem e na etiqueta do produto a sigla M.R.P (Maximum Retail Price), que é o preço máximo que o comerciante pode lhe cobrar.

Cliente quer comprar e o vendedor não quer vender

Como bem descreveu o Mises no livro Ação Humana, numa sociedade de castas, a condição econômica de uma pessoa em nada depende do servir o seu cliente e da capacidade de entregar bons serviços. Logo, na Índia do cotidiano, é normal ver vendedores nem um pouco preocupados em prestar um serviço de forma profissional, trabalham por diversão, literalmente. Muitos demonstram essa atitude de indiferença quando já ganharam o suficiente e passam a avacalhar de vez, agem completamente por emoção. Podem negar vender-lhe algo por não irem com a sua cara ou botar o preço lá em cima… Eles são assim, mesmo.

5 minutos indianos

Pontualidade não é algo normal no Brasil nem no resto da América Latina, disso já sabemos, mas a Índia vai um pouco além. 5 minutos indianos podem se traduzir em 5 horas, em 5 dias, em 5 meses, em 5 anos, 5 séculos; ou em nunca, ou ser algo impossível de traduzir. Aconselho ter um pouquinho de flexibilidade durante a sua viagem, planeje seus itinerários sem ater a horários, pois nunca se sabe o que vai acontecer nos próximos cinco minutos.

Nunca existe um dia igual ao outro

Se for para definir a Índia numa palavra-chave, eu a descrevo como imprevisível, o extremo oposto do cotidiano em que vivia na Suíça. O dia-a-dia caótico, avesso a qualquer rotina, combinado com uma noção de tempo completamente fluida faz com que a vida na Índia seja uma caixa de surpresas todo santo dia. Nunca existe um dia igual ao outro, e esta imprevisibilidade é o que mais se destaca nas minhas lembranças sobre a Índia, até quando comparo com o que vi no Leste Europeu, no Egito, na África do Sul e em outros países por onde passei. Jamais se atenha a planejar o que vai fazer de hora em hora.

Trânsito desordenado

Certamente, a Índia não é o único país com trânsito desordenado, mas sem dúvida o caos do trânsito indiano se destaca em qualquer comparação a respeito. Logo que saí do aeroporto e fui levado por um local à casa onde ia morar, me sentia no meio daquela corrida maluca como se o carro fosse apenas um casco de proteção. Não sabia que, no meu primeiro dia de trabalho, subiria na garupa de uma moto de um dos meus buddies. Na garupa de uma moto no trânsito de Jaipur; lado a lado com carros, motos, autorickshaws, vacas, camelo, elefante. E nada era diferente ao atravessar a rua. Duas semanas depois, lá estava eu perfeitamente acostumado a atravessar no meio de tudo, e de vez em quando, anda a alguns metros de um elefante.

Sujeira e falta de higiene

Sujeira e poeira é o que mais se vê na Índia. Cheiro de mijo era uma das coisas que mais notava nas duas primeiras semanas, depois, você se acostuma e se esquece do mau cheiro. É normal você ver pessoas urinando no chão ao andar pelas ruas, em qualquer árvore e muro no caminho. Os padrões de higiene da grande maioria da população indiana está muito abaixo do que estamos acostumados no mundo ocidental. Você pode mijar em público, mas beijar em público pode dar até cadeia; pode isso, produção? Meus banhos ao voltar para casa eram como se tivesse voltado de uma mina de carvão ou de uma fundição de ferro. A Índia não é para frescos!

Como sempre digo, se você sobrevive à Índia, sobrevive em qualquer lugar. É quase um serviço militar sem ir para a guerra, você se acostuma a tudo de calor extremo a barulhos que deixam a cidade de São Paulo parecendo pacata. E quais foram os seus choques culturais na Índia?

Originally posted 2021-06-05 23:07:50.